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A Gaffe está pronta.
O apartamento desnudou-se finalmente. A luz ocupa o soalho espalhada por uma dimensão que se desconhecia. Parece mais pequeno agora aquele espaço. Incongruentes são as percepções das gentes.
Na véspera escolheu a blusa azul-petróleo, fresca, laçada no pescoço, larga e sem mangas. As calças são ferrugem de linho e seda, perto do corpo. Afuniladas, dizem os que sabem. Os caracóis presos por um lenço cor de girassol, deixam-lhe o rosto livre, olhos abertos banhados pelo mar. Tem os sapatos sozinhos a um canto. Não os calçou ainda. Ainda é cedo. Ainda há tempo para molhar a água. Ainda há tempo para queimar as cores.
A Gaffe respira fundo o fundo da saudade, aquele donde parte a bebedeira dos vagabundos que deixaram de chorar em todas as partidas - as da vida e as deles, que são coisas diversas.
A Gaffe roda o anel com pérolas. Estranhou-lhe o peso mal lho deram. Pousa-o no chão, como se deitasse uma criança. À espera, adormecido junto dos sapatos. Voltarão a andar em breve, mas ainda há tempo para os pés descalços sem o peso do anel que vão suster.
Dizem que é de noiva.
A Gaffe é uma noiva. Dizem que sim e ela não se importa.
A Gaffe está pronta.
O carro chega por fim e fica à espera. A Gaffe desce depois de olhar o mar e de o deixar no soalho aberto em luz anil antigo.
Vai dizer adeus ao Douro e pedir que a terra lhe abençoe o coração das pérolas que pesam.