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Encontrei nestas minhas andanças pela blogosfera uma preciosa peça que listava os blogs mais potentes deste vale de posts. Enumerados por ordem alfabética, tornava-se quase apetitoso visitar cada um deles, pela facilidade de acesso e pelo pouco esforço que um clique nos exige.
Não resisti.
Foram sobrevoados, um por um, nas asas abertas de alguns minutos e há que registar que nestes fugazes voos rasantes encontrei matéria para reflectir - e só Deus sabe o pouco que tal movimento vê a luz.
Confesso que ignorei os primeiros, pois que sempre fui indiferente aos panfletos do Pingo-Doce ou do Continente, embora tenha o vício de folhear os catálogos fininhos, que encontro mortos na caixa do correio, com fotografias e elogios sucintos aos mais inesperados e surpreendentes produtos - desde esfregonas a pilhas a vibradores para os dentes, passando por detergentes para higiene íntima e acabando em material didáctico destinado a pedófilos frustrados que se excitam a ver macaquinhos de peluche que chiam se apertados. Tudo a preços módicos.
Os seguintes vendiam crianças. Provavelmente os filhos das curadoras, porque me pareceu tudo muito maternal.
Admito que já esgotei a pouca capacidade de abrir a boca de espanto e de indignação que destinava ao assunto. Tendo em consideração que agora só abro a boca por motivos maiores e de maior idade, mantive a pose e fui passando indiferente pelas esquinas por onde aquela petizada trabalhava. Não encontrei nenhuma criança que me perturbasse. Todas saudáveis, felizes, fofinhas e rentáveis. Nada a necessitar de intervenção ou de petição para assinar. Confesso o famigerado quero lá saber.
Cheguei ao último e fiquei perplexa.
Encontrei uma mulher bonita, com um travo sofisticado que me agradou, com muito bom gosto, revelando que é cúmplice da câmera que a vai fotografando ao lado da filharada - uma adorável prole, comme il faut -, capaz de fazer com que se não perceba de imediato que está a fazer pela vida vendendo o que lhe cabe em parceria, posando de modo quase profissional e afastando-se claramente da imbecilidade do sorriso maroto, olhar marosca, perninha erguida, com o pequenino pé esquerdo logo ali à frente do direito e mãozinha na cinta de verniz por estalar.
Não me cansou e admito que perdi mais tempo do que o previsto a passear nas avenidas limpas, e mesmo agradáveis, da senhora. Vendia o sonho, o idílico, o desejado, o cor-de-rosa brando, incutia o desejo do inútil, incitava o consumidor de forma relativamente discreta e promovia o cliente que a subornava, sem nunca parecer patética, parola e pateta.
Gostei da senhora.
No entanto, fiquei perplexa ao perceber que, apesar das características que a diferenciavam das outras banais companheiras de folguedos, havia um borrão naquela paisagem quase perfeita.
A ausência da Elegância.
A senhora era desprovida do imperceptível toque da Elegância - mais danoso ainda do que nos casos anteriores em que esta inexistência é já prevista -, que aproxima as mulheres do imaterial, do abstracto, do mistério denso e longo e tantas vezes escuro e impenetrável, capaz de tornar incontornável a presença do silêncio que perto dela, em seu redor, a toda a volta, se vai impondo aos mais banais, até que o fascínio se torne proprietário do desejo.
Faltava a Elegância e essa ausência tornava a senhora bonita, não a vendedeira do costume - pelas razões apensas às parceiras -, mas uma vendedora doutorada.
Talvez por isso tenha percebido que não basta, de modo nenhum, parecermos cool.
Há que ser mulher de César.