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O Pimentas é quase centenário.
Não é um indigente esfarrapado, nem um doloroso sem-abrigo. Tem a inequívoca protecção da minha avó, que lhe dá guarida em troca de ilusórios arranjos nas sebes do jardim, alguns hectares de terra fértil e cardeneta num Banco qualquer, presa no casaco por um fio (casaco e caderneta).
É avarento, malandro e ladino oportunista.
Todas as Segundas, Quintas e Domingos desce ao povoado e pede esmola.
Arrasta o corpo magro e desgrenhado e, planta-se nas ruas que conhece, estendendo a mão à mesquinha burguesia.
Sabe de cor todas as caras e todas as manias e usa a fabulosa teia da lisonja para caçar benévolas moedas e empáticos sorrisos.
- Só volto a incomodá-los daqui a três semanas! – Mente safado, gengivas desdentadas e olhos minúsculos azuis, despudorados.
O seu maior ardil, a sua armadilha tortuosa, consiste em tratar por Senhor Doutor todos os eventuais beneméritos abordados, independentemente dos graus académicos obtidos pelos apanhados.
- O Senhor Doutor não se importa de me dar uma esmolinha? A Senhora Doutora é uma Santa! Só os volto a incomodar daqui a três semanas!
Recolhe o tilintar mais chorudo no boné das moedas.
Ontem, esmolei da mesma forma.
O meu irmão voltou para Paris e eu pedi também a minha esmola.
De alma ajoelhada e mão estendida, mendiguei a Deus:
- O Senhor Doutor não se importa de mo trazer depressa?!