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Quando a visita chegou, foi recebida amavelmente.
Uma senhora atarracada com um ar matreiro e manhoso. Por me parecer sem interesse, ignorei o olhar analítico que me lançou de soslaio. Vinha, salamaleques, visitar a minha avó que a recebeu com a gentileza fria de quem não aprecia as minúcias e as manigâncias dos pequeninos acontecimentos do lugarejo e da missa.
Entrou e apresentou-o:
- Creio que ainda não conhece o meu neto.
Levanto os olhos e atiro-me para a poltrona. Observo. Não há grandes distracções neste lugar!
O rapazinho não tem mais do que dezoito anos - ou tem, mas não aparenta. De raquete de ténis numa das mãos, aperta a minha com a outra, amolecida, deslizante, empapada e de palhinha.
Tem o rosto redondinho e branco, com olhinhos que evitam os meus, mas que procuram de esguelha o corpo do rapagão ao meu lado distraído. Rabinho grande, com nádegas roliças, apertadas numas bermudas de camuflado que deixam os tornozelos ao alcance dos meus olhos. Coloca o pé esquerdo para dentro quando anda, o que faz com que o rabo bamboleie desagradavelmente e o bracinho abana delicado, enquanto segue a mãe pelo salão. É baixinho e redondo, branquinho e quase anafadinho. Niquento, feminino, com a consistência de uma lula. Entremeado como a carne branca que a cozinheira prepara para esturricar.
Evita-me e eu insisto. Observo-o implacavelmente. Quero que saiba que eu já entendi o bambolear do braço da raquete, o mover bochechudinho das nádegas fofinhas e a inclinação da cabecinha que se move delicadamente num desdém suspeito de adolescente tonto, pronto a afastar os dedinhos brancos com um disfarçar do asco que distorce o lábio, enquanto a senhora lhe entrega o chá.
O mocinho é tímido e bem informado. Actualizado. Sabe o que passa nos desfiles que segue pelas revistas caras e conhece de cor a cor que se usa e os pormenores das colecções Dior. Adora Galliano e ama, deslumbrado, as sedas Chanel. Habita-lhe Gucci os sonhos mais leves e despreza Dolce por não querer Gabanna. Gosta de raquetes, mas não joga bem para não desfazer a pose de virgem e beberrica o chá com tostas de cuscas. Recusa olhar de frente para mim, mas sinto-o iluminado quando o rapagão se move. A mim não me quer, o bem-me-quer fresquinho.
Irrito-me.
Nunca entendi aquela hesitação. Nunca compreendi muito bem aquele mimetismo. Nunca percebi a estrutura do sentir que faz um rapazinho mimar uma donzela casta, apenas porque um corpo masculino se estatela no espaço e lhe invade os olhos. Não entendo o mecanismo que produz esta espécie de híbrido irritante e descabido. Não consigo evitar pensar que são eles - meninos iguais a este que salta snobismos de meninas queques, periquitando de asinhas abertas pelo chão da vida -, que traçam os riscos que correrão depois, deixando nos outros a sensação azeda da imperfeição mais tola e minando de uma forma inútil a estatura certa dos homens que amam outros homens certos.
Foi jogar comigo. Deixei-o vencer e disse depois, com voz de catarro, mimando o mais macho que consigo encontrar, que o borbulhante mocinho jogava como um homem rijo e de barba cerrada.
Amuou e foi-se. Roliço rabinho de nádegas moles.