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À entrada da adolescência, decidi que tinha de ostentar um piercing, algures na paisagem do meu corpito ainda breve. Era uma decisão irrevogável até a ter comunicado à minha mãe.
Fui terminantemente proibida.
A minha revolta entrincheirou-se nas acusações de tirania, de insensibilidade, de falta de cumplicidade e de mais uma ou duas tiradas dramáticas até desabar inútil e acabrunhada.
- Sou tua mãe. Sê-lo-ei para sempre, minha querida. Não sou e jamais serei a tua melhor amiga.
Estás proibida de te mutilares.
Invoco este incidente com imensa ternura e profunda gratidão. Creio que foi em consequência dele que percebi a dimensão do comprometimento que implica a maternidade e recordo-o quando vejo da varanda, pela noite dentro, um carro empapado em jovens machos universitários fardados e bêbados que retiram da mala – da mala do carro, insisto -, um jovem colega que parece bastante divertido, pese embora os ganidos e a necessidade de ser levado em braços.
Os jovens machos de traje académico que ficaram para trás, erguem-lhe agora as pernas e o farrapo é transportado deitado de rosto voltado para o chão, para que vomitar não implique paragem.
Estranhamente, pela calada da noite, chega-me à memória o triste episódio do meu frustrado piercing.
Lamento profundamente que a mãe de cada um dos protagonistas da praxe a que assisto nunca lhes tenha negado o que exaltava na minha adolescência e que supunha ser a vitória e a glorificação da maternidade. Foi uma pena que nunca tenham ouvido:
- Sou tua mãe. Estás proibido de te mutilares.