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Sei que a minha vida depende da agenda dos outros.
Trata-se de uma relação mais simbiótica do que parasitária. Forneço a possibilidade de me controlarem a banalidade e, em troca, oferecem-me a capacidade de os manipular devagarinho, quando as questões me parecem vitais para o meu equilíbrio interior naturalmente instável.
Pode parecer cínico, mas é muito cómodo.
É-me indiferente o facto de, ontem ao fim da tarde, me terem arrancado do Porto, com uma mala desordenada e aborrecida, me terem enfiado no carro e me terem informado, finalmente, que iria passar uns repousantes dias no Douro, antes de partir para sempre.
- Desta vez não haverá mais florinhas para regar aqui. A priminha garantirá que restarão apenas as da tua cabeça.
Aprendi que se torna muito mais saudável se me deixar levar em vez de espernear e me debater em nome de causas que não afectam o que realmente desejo.
A maior parte das vezes, o controlo que pensamos exercer sobre a vida dos outros, não passa de uma forma subtil de sermos manipulados por eles.
Acordei hoje com os latidos furibundos da sucessora de Bórgia, a cadela Cartier, e com o chilrear de umas coisas com penas e com bicos, a minha Jacinta trouxe-me o pequeno-almoço e na bandeja havia beijos e ternura para barrar o pão quente e a minha prima, futura agente dupla, está no jardim a cantar desenfreada Singing in the rain.
Tudo está correcto. Tenho apenas de verificar a consistência dos fios dos fantoches.
Ilustração - Catrin Welz-Stein