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Ao contrário do que parece ser habitual nos ouvintes que pela insistência acabam por reconhecer que determinada melodia lhes agrada, depois de a terem considerado atentado aos seus mimosos ouvidos, repetir Conan Osíris e os seus partidos telemóveis, tem um efeito contrário em mim. A surpresa muito positiva que foi a estranheza levada ao um extremo inusual da canção que defende, passa, em cada vez que o ouço, a uma irritabilidade muito pouco simpática.
O rapaz cansa-me.
Conan Osíris vai esgotando a sua capacidade de seduzir com a imagem de excêntrico, muito street/trash/chic - ya, ‘tás a ver? -, e muito pouco mainstream; com a sua voz que invoca outras ainda mais potentes e com a mescla um bocadinho suspeita de ritmos e de frases melódicas oriundas de outros carnavais.
É constrangedor referir o bailarino que o acompanha, pois que se da primeira vez que o vi senti uma ligeira vergonha alheia que disfarcei, pois que era fruto dos meus mais negros preconceitos, agora reconheço-lhe um amadorismo, que a alegada improvisação acentua, que me deixa perplexa e assumidamente envergonhada.
É evidente que o intérprete reúne todas as características que lhe dão a hipótese de se tornar campeão do Eurofestival - as que se referem, contabilizam -, mas, por estranho que possa parecer, dada a consagração de que é alvo e a aclamação das suas qualidades, quer vocais, quer de compositor, não acredito que dure muito mais tempo a minha paciência para o voltar a ouvir.
Esta minha sensação é fortalecida com o facto de existir Só Um Beijo de Luísa e Salvador Sobral.
A propósito, ou talvez nem por isso, levanto-me e aplaudo Salvador Sobral e a elegantíssima lição de jornalismo que este rapaz entrega de bandeja a Judite de Sousa que termina a entrevista relacionada em exclusivo com o novo trabalho do intérprete com a ronhosa e ranhosa pergunta:
- E a sua saúde como vai?
que recebe esta brilhante resposta:
- Bem. E a sua?
A canção dos manos, com uma letra muito bonita, é de uma originalidade tão limpa e tão completa que chega a parecer fácil, frágil e evidente, esperada e pronta desde o início - quase desde a infância, porque há de certa forma um evocar dos ritmos que a povoam.
A canção vai fluindo devagar, quase contida, e sempre com a cristalina e fascinante surpresa, da descoberta do único, do novo, do nunca ouvido que não se escapa por fendas da excentricidade histriónica e menos inteligente.
É sobretudo belíssima e encantatória a mescla de frases diferentes que se enlaçam, sem atropelos, cantadas pelas duas vozes que se vão aproximando até desaguarem num mesmo verso. Nada é deixado solto, a não ser a perfeição das duas vozes juntas.
A diferença e a originalidade - não são sinónimos - estão bem presas.
Este facto, reporta-me finalmente aos adereços de Conan Osíris.
Se o rapaz usa uma lata na cara, sendo a lata mal moldada, mal colada, mal segura, mal desenhada, é apenas por não saber que Alexander McQueen já fez melhor.