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A perspectiva misógina, machista e beata é sempre suportada pelo estereótipo e contém inevitáveis preconceitos.
Sendo a mais básica e sintética formulação do pensamento, o estereótipo - em consequência falso e enganador -, é também a mais fácil forma de comunicação de massas. Propaga-se com facilidade, endurece facilmente e permanece como um gato morto tombado na mesa do jantar. Ninguém o remove porque toda a gente espera pela chegada do messiânico mordomo que servia D. Sebastião.
A ligação que é feita entre o comprimento da saia de uma mulher e a sua personalidade é das mais enraizadas tolices de que há memória - uma memória de passado longo e com um futuro promissor -, mas é também e ainda o mais rápido modo de formular um julgamento acerca do mistério feminino.
Apanham-se as migalhas quando o banquete cobiçado é interdito.
Para uma mulher inteligente esta idiotice é divertida e aumenta-lhe as hipóteses de brincar com toda a espécie de tolos bem-parecidos. Permite-lhe ser, em cada saia, a mulher que um palerma qualquer deseja no escurinho dos seus estereótipos.
Uma rapariga sente que, todas as vezes que depara com jovens noivos da Santa Madre Igreja, a atracção pelas longuíssimas batinas e alvos paramentos a leva à tentação de traçar rotas e de rumos que a levarão ao fogo (neste caso, do Inferno).
Somos pecadoras quando o proibido se cruza com o nosso desejo desde o primeiro tempo paradisíaco. A sedução do interdito recolhe em nós, raparigas espertas, terreno fértil e arranja sempre forma de eclodir.
A coragem (e sublinhemos que a coragem é, como diria a minha santa avó, o cagaço* de armas na mão) de rasgar as películas que nos separam do que nos atrai, leva-nos ao uso subtil de elementos que nos trazem o aroma do embargado, do obstruído ou do tolhido.
A fantástica blusa da imagem traz o perfume dos juvenis nubentes sacros que nos corredores de um latim granítico, abrem breviários, iluminam altares, acendem pavios e dispersam incenso.
Sentimo-nos abraçadas pelas suas orações mais reservadas.
A fabulosa saia, invoca-me, de modo surreal e pouco razoável, os estranhos aventais maçónicos, sabe Deus porquê!
Questões a discutir com a turma mais garbosa de seminaristas.
*Pardon my french
Os joelhos são a perdição de uma rapariga esperta!
Nunca nos contentamos com os que temos. São demasiado ossudos, fazendo-nos parecer um aglomerado rochoso capaz de fazer tombar no vácuo qualquer alpinista ou planos e desérticos, transformando-nos em gorduchas e roliças mocinhas dos anos 20.
O corte da saia que colmatará esta maníaca sensação é solução quase tão perigosa como o problema. Se não conseguirmos aguentar a tubular, justa e travada peça, tornamo-nos uma espécie de sopeiras recatadas ou pudicas catequistas de província.
Há, contudo, forma de contornar a tragédia e de nos vermos perfeitas de saia travada e de joelhos tapados.
A solução está naquilo que a acompanha.
A imagem de Audrey Hepburn, neste exacto caso, não pode ser ignorada. Ninguém com Hepburn usou saias travadas com tanta distinção, entregando-lhes o estatuto de peça de eleição das mulheres em que a elegância é uma forma de viver e, consequentemente, inseparável do estar.
O uso de saias travadas, cobrindo o joelho, é arriscado, mas é, talvez pelo risco, uma das maiores aventuras do gurada-roupa feminino. Usemo-las com parcimónia e saibamos escolher os sapatos que não a aniquilam (os pumps são assassinos) e as peças que as fazem cintilar (camisolas de gola alta e manga curta são perfeitas).
Depois é só passar pela Tiffany's, beberricar um chá e escolher um colar de pérolas discreto.